quarta-feira, 14 de março de 2012

Pessoas e coisas


Estranhei a ausência dela e liguei ao início da tarde para saber se estava tudo bem. Que não. Que estava quase tudo mal. Fiquei apreensiva, é daquelas pessoas que raramente diz que não está bem (mesmo quando não está). Preocupada, já, perguntei-lhe  o que não queria saber. E ela respondeu-mo. O que eu não queria saber.
A vida, às vezes rouba-nos indecentemente a oportunidade (que aparentemente nos dá) de vivermos as coisas que concede a outros com tanta facilidade! E pode nem ser muito o que há a conceder, e ser tanto o concedido! E torna-se imensamente difícil compreender racionalmente o porquê de certas coisas e apetece-nos rir do mundo e tornarmo-nos pessoas de olhar apagado, amargas.
As noticias fizeram-me pensar noutra amiga com quem falei por altura do seu aniversário, quase no final do ano passado, e de quem ouvi o que não queria ouvir, também. Mora igualmente no meu coração há muitos anos, e falarmo-nos (pelo menos) nestas ocasiões é algo de que ambas não abdicamos. É quase uma irmã, morámos juntas quando estávamos na universidade. Atendeu, dei-lhe os parabéns e balbuciei o “tudo bem?” sem esperar resposta, enquanto lhe ia contando de uma só vez as novidades que ansiava por partilhar. Finalmente calei-me, tive noção do silêncio dela e de que até me tinha respondido um triste “mais ou menos” quando, sem consciência, os meus lábios se tinham aberto para o “tudo bem?”.
Mau! Mais ou menos?
Que tinha uma cena num peito. O que queria ela dizer com uma “cena” num peito? Um “problemita”. Estou em tratamento.
Uma vontade sem tamanho de chorar e de esmurrar a parede que entretanto me aparecia à frente, mas foi-me saindo um “oh! estás a brincar…” desesperado.
Não se ouviu nenhuma voz. Era a voz de ninguém. Depois ouviu-se a voz dela que me dizia para parar de chorar porque o tratamento estava a resultar e que iria ficar boa. O ridículo! Ela! Ela que o vivia, que o sentia, estava a consolar-me a mim!
“Como se o não ficares boa fosse uma possibilidade!” -  quase lhe gritei como se o facto de o fazer tivesse alguma influência no processo. Como se a minha vontade fosse a cura para a dor e para tudo. 
O que senti depois disto ainda não consigo explicar. Fez-me pensar. Estas coisas fazem-nos pensar. Na verdade, fiz-me espécie a mim própria. Senti-me um pouco envergonhada por estar agora a pensar mim, em alguns aspetos e situações da minha vida aos quais dei demasiada importância e não a tinham;  e noutros a que dei pouca importância e teriam merecido mais. Não sei se a altura do ano também ajudou (estava perto o ano novo, até inconscientemente se fazem balanços, e há as New Year's Resolutions...).
Lembro-me de ter pensado no António Feio e nas palavras que os ouvidos deste país (mundo, enfim) ouviram com uma sensível consciência: “Não deixem nada por fazer”.
Se calhar não existe “não deixar nada por fazer ”, mas pode existir deixar menos por fazer (por dizer). 
Tive casos em que fiz. Tive casos em que disse. É claro que o nosso mundo interior não é o dos outros e é de esperar reações de estranheza (embora eu tivesse em mim a esperança de que todos fossem reagir bem à minha – subentendida -  proposta de paz ou tréguas). Não foi assim. Nem podia ser. Infelizmente, consegui ler em algumas pessoas o “esta agora lembrou-se e quer o quê?”, deixando-me triste.
Não me arrependo. É óbvio que a sensibilidade não é essencial à existência humana e há quem opte por não a ter. Cresci.
Há coisas que não valem a pena.
E pessoas que também não.

1 comentário:

NUXA disse...

E haveria tanto para dizer (mesmo a sério)!
Há momentos em que é difícil segurar...
O importante é acreditar sempre e nunca desistir!
Gosto de ti*